Juliana Frigeri da Silva
Especialista SBNO – Rio de Janeiro, RJ
Terapia nutricional e desnutrição no câncer
A desnutrição e as desordens metabólicas, comumente encontradas em pacientes oncológicos, é um problema global de saúde pública e podem impactar negativamente no curso da doença¹. A resposta ao tratamento e a qualidade de vida estão associados ao estado nutricional do indivíduo². Pacientes desnutridos com câncer têm qualidade de vida reduzida, estado funcional diminuído, menor tolerância ao tratamento e maior tempo de recuperação quando comparados a pacientes bem nutridos³,4.
A prevalência de desnutrição em pacientes com câncer pode variar de 20 a 80%, sendo mais comumente encontrada entre idosos e em estágios mais avançados da doença, principalmente, entre aqueles com câncer gastrointestinal, de cabeça e pescoço, hepático e pulmonar5. Cerca de 10 a 20% dos óbitos de pacientes oncológicos podem ser atribuídos às consequências da desnutrição, e não devido ao câncer de fato6.
A causa de desnutrição em pacientes com câncer correlaciona-se ao processo da doença e aos tratamentos submetidos6. Os efeitos colaterais relacionados à doença e ao tratamento que contribuem para o desenvolvimento da desnutrição incluem anorexia, saciedade precoce, fadiga, depressão, dor, náusea, mucosite, má absorção e alterações do paladar, todas levando à ingestão oral inadequada3.
A terapia nutricional (TN) é de extrema importância e, indiscutivelmente, indicada para todos os pacientes em tratamento antineoplásico, desnutridos ou em risco nutricional, incapazes de ingerir e/ou absorver os nutrientes adequados para sua condição7,8,9.
As vias de acesso para a terapia nutricional são oral, enteral e parenteral. Tem por objetivo manter ou recuperar o estado nutricional, evitar progressão para um quadro de caquexia ou sarcopenia, modular a resposta orgânica, melhorar a resposta imune, controlar efeitos adversos relacionados ao tratamento, melhorar a qualidade de vida ao paciente, entre outros10,1.
A escolha da TN será decorrente da localização do tumor, do tratamento oncológico recebido (se curativo ou paliativo), dos sintomas apresentados e do estado nutricional4 e deverá ser iniciada antes mesmo dos pacientes apresentarem-se desnutridos6.
A forma preferencial de TN é por via oral, primeiramente por meio da alimentação convencional. Neste caso, a orientação nutricional tem papel de estimular o aumento da ingestão de proteínas e energia, garantindo a manutenção ou recuperação do estado nutricional6. Porém, quando a alimentação convencional está comprometida, o uso de suplementos nutricionais faz-se necessário como estratégia para melhorar o aporte energético e de nutrientes2.
A terapia nutricional oral (TNO) é a primeira opção em terapia nutricional por ser a via mais fisiológica e está indicada quando a ingestão alimentar é menor que 70% das necessidades nutricionais10.
A TNO pode ser muitas vezes difícil e de resposta lenta, principalmente entre os idosos, porém a alimentação oral assistida e o uso de suplementos, juntamente com reabilitação física e psicológica, parecem benéficos para a maioria desses indivíduos, devendo ser considerada antes do recurso a uma sonda11.
Entretanto, quando a ingestão alimentar oral não for possível, o início da terapia nutricional enteral (TNE) deve ser precoce (dentro de 48 horas), e se a via oral for insuficiente (menos de 60% das necessidades nutricionais do terceiro ao sétimo dia), a TNE deve ser instituída2.
Nos casos de câncer de cabeça e pescoço ou câncer de esôfago obstrutivo, a TNE deve ser iniciada precocemente, pois tais tumores podem impedir diretamente a ingestão de alimentos e levar rapidamente à depleção grave do estado nutricional1.
A indicação de terapia nutricional parenteral (TNP) reserva-se aos casos em que o sistema digestório não pode ser usado de forma total ou parcial. A TNP poderá ser indicada simultaneamente com a nutrição enteral, quando a oferta de nutrientes por essa via for menor que 60% das necessidades nutricionais por um período de tempo maior que 10 dias1,12.
Quando a via oral ou via enteral estejam contraindicadas para alimentação, a TNP deve ser iniciada após o terceiro dia em pacientes de alto risco nutricional e no sétimo dia nos demais casos2.
Já em pacientes em cuidados paliativos o benefício do suporte nutricional precisa ser cuidadosamente considerado, levando em conta aspectos sociais, psicológicos, espirituais e culturais do paciente, inclusive o prognóstico do câncer6. Os objetivos mudam conforme a doença avança e a condição clínica se altera, devendo ser reavaliada periodicamente2.
Quando a sobrevida esperada for de vários meses ou anos, a TN deve ser administrada com objetivo de garantir ingestão adequada de energia e proteína e qualidade de vida subjetiva6. Porém, no final da vida, além da TN não trazer benefícios, existem ainda efeitos adversos, sendo assim, é recomendado priorizar a alimentação por via oral dando conforto ao paciente2.
Contudo, a nutrição é fundamental no tratamento multimodal do câncer, sendo responsável pela identificação, prevenção e tratamento da desnutrição nestes pacientes. Os aspectos nutricionais devem ser considerados e integrados aos tratamentos antineoplásicos.